Já tiveste medo do escuro?
- Rosana Andrade Pina

- 7 de nov. de 2023
- 4 min de leitura
Nos seus primeiros meses, quando ia adormecer a minha filhota, lembrei-me que tinha medo do escuro.
Enquanto mamã de primeira viagem, queria fazer tudo bem à primeira. Então, seguindo todas as indicações de uma especialista de sono de confiança, sabia que teria de adormecê-la no quarto, sem luz nenhuma, nem mesmo uma luz de presença.
O objetivo era: promover um sono, de melhor qualidade possível, à minha bebé. Já que o da mãe, já teve melhores dias.
Então lá fui...
Eu sou alguém que gosta de dormir no breu total, por isso não me importa dormir totalmente no escuro, mas o desafiante aqui era: colocar para dormir uma bebé, que nasceu há pouco tempo, com a qual, eu ainda estou a aprender a lidar e a conhecer.
Já no quarto...
Fecho tudo mas deixo alguma luz na sala para não me sentir sozinha e cá vou eu.
Fecho a porta do quarto e tudo parece bem.
- Será que é agora que os fantasmas vêm? E se ouço algum barulho, e se algo me toca, e se está aqui alguém a olhar para mim e eu não estou a ver?
A imaginação começa a fluir e, apesar de estar com a minha princesa, o medo começa a fazer nascer pensamentos negativos. Uma criatividade bem tóxica.
Vejo uma luzinha no buraco da fechadura da porta e começo a imaginar ainda mais coisas, a cabeça não pára.
E aí, a Chloé na sua língua de bebé, começa a fazer aqueles barulhos que o adulto não entende bem o que é.
De luz acesa, a olhar para aquelas bochechas fofas é um momento muito lindo mas depois de apagar a luz, tu pensas :
- O que é que se passa com esta bebé? Que barulho é este?
Ai que medo, este som está-me a assustar...
E acabas por voltar a acender a luz para ver se tudo continua no lugar e se a bebé continua a ser a bebé fofa de quando a luz está acesa.
Eu sei, parece parvo mas a falta de controlo e visão que o escuro nos dá, pode trazer-nos os pensamentos mais estúpidos. Daqueles que até temos vergonha de partilhar, como este!
É verdade! Eu ficava com medo dos sons que a minha bebé fazia.
E o pior, é que não ficava por aqui, para confirmar que estava tudo bem e que ela não estava a ver algo que eu não estivesse a ver, eu acendia a luz e olhava bem fundo nos olhinhos dela para ver o reflexo, como a olhar para um espelho de forma a ver o que estes refletiam.
Não encontrava nada, a não ser o meu próprio reflexo.
Voltava a tentar, apagava a luz, mas o medo voltava a aumentar, e eu acabava por voltar a acender a luz.
Contudo, apesar de eu sentir medo, eu não queria que ela sentisse o meu medo e também ficasse com medo.
Estávamos sozinhas e eu era o porto seguro dela. Que grande responsabilidade.
Quando o papá estava em casa, parecia que todos os monstros do escuro fugiam, sentia-me segura, não tinha qualquer medo.
O estar sozinha com ela, fazia-me sentir desprotegida, e logo numa hora em que eu tinha de ser a adulta da situação, a protetora e cuidadora.
A solução
Apesar de acreditar em Deus, este mundo que não se vê, assusta-me e ao mesmo tempo que quero conhecer mais e ver aquilo que só se sente, também acabo por ter medo de ver algo com o qual não consiga lidar, seja este bom ou mau.
Foi a partir daí que tomei uma decisão : Não vejo mais filmes de terror.
E acreditem que ajudou. Percebi que ver esses filmes alimentava a minha mente e que, por isso, aqueles barulhos fofos de bebé tornavam-se barulhos estranhos como o do filme The ring só pelo facto de eu estar no escuro.
Então decidi:
- Chega! Não vou mais alimentar a minha mente com aquilo que me traz ainda mais medo e me faz pensar no que não existe naquele momento.
E acreditem que, desde então, o medo diminuiu bastante. Alimentar a minha mente com coisas positivas, fez com que parasse de imaginar monstros na minha cabeça.
Não foi tudo logo assim à primeira, tive de tomar outras atitudes também.
Um dos exercícios que a psicologia positiva nos apresenta para o desenvolvimento da resiliência e para ajudar em situações de ansiedade é o de perceber bem o que se passa à nossa volta, ir a factos.
Então, agora, cada vez que ia adormecer a Chloé olhava bem à minha volta, olhava para onde estava cada coisa e quando apagava a luz, cada vez que vinha um pensamento de medo eu questionava a sua veracidade.
Eu perguntava a mim mesma:
- Este som é mesmo de um fantasma ou é simplesmente o vizinho a tratar da sua loiça? Aquela luz que parece estar a acender e apagar, está mesmo a acender e apagar ou simplesmente é a minha visão que se está a adaptar ao facto de eu passar de um quarto iluminado para um quarto com a luz apagada?
Por último, pensava:
- Se aqui houvesse fantasmas e se os fantasmas fossem transparentes, então os mesmos fantasmas que existem quando não há luz, também existem quando há luz. Por isso, nada mudaria.
E no caso de existirem fantasmas, o Deus e seus anjos que me protegem quando estou de luz acesa vão intervir também, quando a luz se apagar.
E assim foi, um dia após o outro, fazendo este exercício até que o medo foi diminuindo.
Acabou para sempre? Talvez não.
Há dias, em que estou mais sensível, que noto que uma má notícia na tv mexe comigo e a sensação que essa notícia me traz faz com que naquele momento eu sinta mais medo. Então é normal por vezes sentir medo, mas o que nos ajuda a ultrapassá-lo é perceber o que está a alimentá-lo, e por fim, o que é real nesse medo e o que é imaginação.
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